celine
Não andam faunos nos bosques do meu outono
segunda-feira, 7 de outubro de 2024
"(...)
Tu mar!, também a ti me rendo - adivinho o teu sentido,
Da praia observo os teus dedos curvos e convidativos,
Creio que te recusas a regressar sem me teres em ti,
Devemos estar juntos algum tempo, dispo-me, leva-me depressa para longe da terra,
Aconchega-me suavemente, embala-me na tua sonolenta ondulação,
Bate-me com a tua amorosa água, posso retribuir-te.
Mar de grandes vagas espraiadas,
Mar de ampla e convulsiva respiração,
Mar do sal da vida e dos túmulos por cavar mas sempre abertos,
Mar que brames e esculpes as tempestades, mar caprichoso e sublime
Fundo-me contigo, também sou de uma e de todas as fases.
Participante do fluxo e do refluxo sou, exalto o ódio e a reconciliação,
domingo, 6 de outubro de 2024
De pontas polidas, um tira-linhas desenhou -
pelos traços cursivos dos dias – a rectilínea da tua vida -
num alçado simples, com adornos de alegria,
relevos de tristeza – sem pretensões;
mas nem por isso
menos talhada, menos fendida,
que pela singularidade de uma vida humana.
(E as palavras necessárias,
pedras cravadas nesta estéril pena!...)
Obedecendo à forma da mãe
em flores coroada, barrando os caminhos;
mas os ramos sanificados pela esposa colhidos.
Num sopro de vida à terra-mãe lançado,
por uma mirada invertida,
moldaste uma cefeida fora do universo.
(E as palavras necessárias, pedras
embotadas nesta estéril pena!...)
De negra tinta-da-china mancharam-se os últimos anos…
À escala de um compasso torcido,
em esquadrejada crispação do andante,
sulcaram-se penosos momentos,
cotas de angústia, pelo estilete do fado…
E renascia a criança desligada do corpo
que inexoravelmente a subvertia.
(E as palavras necessárias,
pedras obtusas nesta estéril pena!...)
Na talha dos dias derradeiros,
sob a gárgula das lágrimas, da desesperança,
à espera, sempre à espera,
da cefeida regressada de arquétipos jazentes,
para o cenário da ruína da vida,
que é a morte.
Hoje, na aguarela verde e azul em que mareia
o teu antolhado barril, eu vejo fundear
as jubilosas cinzas do que foste.
(“Bate-me com a tua amorosa água, posso retribuir-te.
Mar do sal da vida e dos túmulos por cavar mas sempre abertos,”) *
Na lonjura do esquadro céu terra mar,
é, de ora em diante, na incomensurável espuma quântica
que flutua sempiterna a memória de ti (Pai).
*Walt Whitman, Canto de Mim Mesmo
quinta-feira, 20 de junho de 2024
SOLSTÍCIO DE VERÃO III
SOLSTÍCIO DE VERÃO II