domingo, 14 de fevereiro de 2016

Hoje é Dia de S. Valentim.

Instituiu-se que hoje é um bom dia para celebrar o amor, como se o amor tivesse agenda para acontecer.
Amanhã, pelos vistos, já não será um dia adequado para a celebração – do amor.
Hoje, sim, temos franca permissão para amar. Com muitos coraçõezinhos - vermelhos, claro está, porque, até para adeptos de outras colorações, o dia de hoje impõe-se a vermelho, assim mesmo, com o sentido reaccionário da cor.
Mas, dizia eu, com muitos coraçõezinhos vermelhuscos, com muito morango (lá está o vermelho!), muito chocolate (esta conexão, para mim, constitui, ainda, um mistério, até porque eu como chocolate todos os dias, esteja amando ou não…) e vinho tinto (suspeito que seja pela proximidade da cor vermelha).
Amanhã, parece, já não será um bom dia para o amor. Mas hoje é.
Amanhã, depois se verá.
Há várias formas de amar, é certo, mas, neste dia, parece que só importa a forma I love you – frase replicada à exaustão em almofadinhas (em formato de coração vermelho…), ursinhos, cãezinhos e, provavelmente, outras mimosas espécies zoomórficas, cartõezinhos, molduras, castiçais de velas, não esquecendo a novel minionsmania … e o mais que o engenho e arte comerciais permitirem engendrar com vista fina na inesgotável fonte de amor pelo lucro.
E, hoje, eu estou muito triste – apesar de ter recebido um coraçãozinho de chocolate (e, sim, tinha outro coração mais pequenino vermelho).
E estou muito triste por me ter lembrado do Miguel. O Miguel que, neste fim-de-semana de celebração do amor, teria feito 37 anos de idade, não fosse a chatice de ter desaparecido há dois anos vítima da errância de uma (outra) malograda seta, um galopante cancro nos pulmões.
O amor entre uma mãe e o seu filho parece-me ser uma forma sublime e inigualável de amor, não para ser lembrada apenas num domingo de Maio, mas a valer para a vida inteira, muito para além da morte, porque intemporal.
Lembrar-me do Miguel, neste Dia de S. Valentim, é lembrar-me, igualmente, de um dos meus males de amor - o que vai escrevinhado aí mais à frente.
Compreendo que este escritozinho – alinhavado em Aveiro, por ocasião do Dia de Finados de 2014 - não tem importância para figurar num blogue, quanto mais ser publicamente divulgado.
Mas permita-se-me, neste Dia de S. Valentim, dar largas, muito egoisticamente, ao meu amor por mim e esbandalhar a minha autocomiseração, como só em actos de amor (bobo, como todo o amor egoísta pode ser) se é capaz de fazer.
É que reservo para mim a secreta esperança que, estripando, assim a céu aberto, as perdições da minha alma, eu ainda encontre salvação…
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Passaram 6 meses. A Amélia ainda sofre – mesmo conciliada com sedativos e anti-depressivos.
Dor de Mãe que não volta, nunca mais, a rever o FILHO, que morreu.
Com ele, sepultou os seus próprios sonhos, as suas íntimas esperanças, as suas manifestas alegrias – momentos da vida que aconchegou dentro dela durante 9 meses, que sublimou no primeiro sorriso, que guiou nos primeiros passos, que ensinou nas primeiras palavras, que escutou na primeira paixão…
Esses jovens braços que, inânimes, baixaram à terra, não mais a acariciarão num apelo quente de “Mãe”, não mais a abraçarão num beijo atabalhoado de gostoso…
Resta-lhe a memória do que foi; talvez, uma saudade do que já não vai ser.
Eu não sei que dor é essa, a de perder um FILHO.
Não saberei nunca.
Mas não saberei, igualmente, que frémitos suaves, que sussurros débeis são esses que se sentem no ventre que dará um FILHO.
Que amor é esse de ouvir chamar “mamã”, “mãe”!
Que doce sentir é esse de tocar na macia pele de um filho, de acarinhar mãos e pés, tão pequeninos!
Que música de encantar, o balbuciar, o palrar infantil, o gargalhar juvenil, o murmurar da voz de um FILHO!
Nada sei de sonhos, de esperanças, de alegrias de um FILHO.
Nada sei da dor do sangue que escorre do meu sangue. Nada sei da dor na carne que desencarna de mim.

(Porque o meu sangue fenece!
Porque o meu ventre é má terra!
Porque toda eu sou incompatível com a inocência, com a ternura, com o amor!)

A minha dor é de outra natureza; talvez por falta de uso, talvez por defeito de fabrico …
A Amélia tem uma memória cheia: cheia do amor de Mãe, cheia do amor do FILHO, cheia das alegrias e dos sonhos de infância, cheia de maternidade.
Fica-lhe, agora, a tristeza de uma marca, ou melhor, de um pedaço seu que não pode mais abraçar, beijar, sorrir, ralhar, chorar, no seu amor vivo e desperto de Mãe.
Mas fica-lhe, todavia, o coração cheio de um FILHO que teve e lhe deixou MEMÒRIA de amor.
Eu ficarei sempre com o coração vazio do filho que não tive e que deixou um buraco na memória do meu (des)amor.
A Amélia conhece a dor da perda de um FILHO.
A Amélia conheceu o amor do nascimento de um FILHO.
Eu não conheço a dor da perda de um filho.
Eu não conheço o amor do nascimento de um filho.
A perda da Amélia é uma dor imensa.
A minha perda… é só uma falha. 
 
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Neste Dia de S. Valentim declaro o meu inteiro amor a todos os filhos que eu não tive.

sábado, 13 de fevereiro de 2016

Apelavam por mim umas atribuladas reflexões imperiosas
de uma tese improvidente da intangibilidade da dignidade humana;
mas eram logo alienadas e violadas pela tua essência orgíaca,
surda às iníquas súplicas da minha essência ansiosa.
 
Ardem os meus lábios nos teus beijos…
Molha a loucura do meu corpo a tua boca…
Cravam no desejo as minhas mãos enconchadas na tua mão…
(Dóis-me tanto, ainda!…)

A minha alma doente de exaltação, febril da rêverie,
ora retesava-se na tensão melancólica da guitarra de Cluster One,
ora entoava o sedutor engano de Puccini, 
(Vieni, vieni… via dall’ anima in pena l’ angoscia paurosa) 
 
Marcam-me a pele as nódoas do amplexo no teu prazer…
Adoça o suor do teu mel a minha língua…
Açoita-me a tua fala de murmúrios obscenos…
Porque me dóis tanto… ainda?...

Ia para o mar, com braçadas fustigantes
na fome e na sede do meu corpo por outras vagas de prazer;
mas logo me gritava o teu corpo de sal e de espuma na crista da onda
e num lip off mareavas-me os sentidos às profundezas da negra tristeza.

E eu não quero que me doas mais.

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Demora-se num dia improvável e num local improvável,
um cálice de brandymel ou um bourgogne de tinto morno,
que emulsionará a poesia que me desvelará, corpo no corpo,
e que eu procuro e que eu quero… (e não me abandono!?…)
 Vem, Poeta, vem! 
E lava-me a loucura ferida do corpo na lavanda balsâmica da tua seiva.
E purifica-me a alma dolorida com o feitiço encriptado no teu poema.  
Que é, agora tua, a hora de com o teu canto representares a deixa
de me libertares do teatro das angústias a alma que ali se enferma.  
 Vem, Poeta, vem! 

 

sábado, 6 de fevereiro de 2016

(Foto: celine)
 
 
comigo falhar falhar
falhar falhar falhar
falhar sempre falhar
falhar falhar falhar
falhar   falhar   tudo