(Macedo
de Cavaleiros, Trás-os-Montes - Portugal)
(Fotos:
celine)
Um
carnaval português
Andava
eu distraidamente embraseada com a câmara em punho quando…
…
tau!
Levei
com os chocalhos - assim, logo na primeira noite…
O
costume era serem sempre rapazes. Hoje, alguns são tão jovens que
figuram-se souvenirs de miniaturas de caretos. Já noutros, notam-se
proeminências umbigadas sob a colorida roupagem.
Vestem-se
com fatos feitos de grossas e coloridas mantas de lã e cobertos, da
cabeça aos pés, com franjas tricolores, os rostos iludindo-se atrás de
máscaras de chapa pintada de vermelho - noutro tempo, eram de madeira e de
couro, mas como por estes dias já ali não brincam artesãos lança-se mão da
chapa da casa…
Diz-se
que, durante os festejos, não podem tirar as máscaras para se lhes descobrir os
rostos - são dois anos de azar!
A
avaliar pelo número dos que zanzavam com os gorros descidos e as máscaras no
topo da cabeça, Podence será, em breve, um abrigo de muitos homens com
pouca sorte aos pares.
Sobre
os fatos agarram-se, cruzados no peito ou atados à cintura, os cintos de
sinetas e de chocalhos, que juntos compõem uma sinfonia endiabrada excitando os
gritos guturais soltos nas vozes afinadas consoante o diapasão de
cada careto.
E
lá se soltam, também, os homens e os rapazes aos pulos, numa dança frenética e
ruidosa, para baixo e para cima nas ruelas de Podence, à caça de raparigas -
dantes mimosas e solteiras, agora apenas desabusadamente distraídas…
Quando
caçam alguma, abraçam-na pelos ombros e num swing de ancas sacodem os
chocalhos investindo em cima dela. Diz-se tratar-se de um ritual de
fertilidade…
Aos
homens batem-lhes repetidamente nas cabeças com a ponta final da trança do
colorido gorro.
E
as travessuras grotescas da tradição?!... E as chacotas abusadas do
passado?!...
Encontram-se
como o cenário transmontano de algumas casinhas de informes pedras
xistosas e cruas, com vãos esventrados pela fome corrosiva das ervas daninhas,
despencando-se em vidros, pregos e tabuinhas - em suma, caíram por desuso.
Ruelas
abaixo… Ruelas acima… a chocalhar; à parte esse swing chocalheiro,
nos dias de hoje, o terreiro do Carnaval de Podence parece estar
privilegiadamente reservado para as selfies das raparigas (elas
sim!) bem agarradas aos caretos.
É
um arraial de cores e de graça, com muito pitoresco, para se arrolar no
Inventário Nacional do Património Imaterial Cultural português, e justificar
rasgar os mais de quatrocentos quilómetros de asfalto entre Lisboa e Macedo de
Cavaleiros.
Mas
aspirando a desfilar na passadeira vermelha do Património Mundial… hummm… será
bem avisado ajeitar as pedras de xisto, botar portas e janelas nos vãos, assar
bom butelo e cozer mais cascas, achincalhando melhor o Entrudo e sempre,
mas sempre, a chocalhar freneticamente as ancas.
Até
lá...
... Entrudo queimado,
Carnaval acabado!