terça-feira, 15 de dezembro de 2015

Carta ao Senhor Pablo Neruda.


Virei as costas ao desprezo, à indiferença, à obtusidade,
por um trabalho reconhecido, mas, no final, impudentemente explorado,
e corri, destemida, em busca de uma esperança renovada,
contrariando certos ecos de bom senso,
para não morrer lentamente na inércia, na frieza, na cobardia.

E, lamentavelmente, a batalha do meu esforço progrediu
na razão inversa da força anímica da minha vida...

Convencida da ínfima importância da sorte ou inspiração
na garantia do sucesso, só conseguido com trabalho árduo e devoção,
abracei, com receio contido, projectos novos e desafios ignorados,
enfrentando os abismos vertiginosos de um saber, ainda, desconhecido.

E, estuporadamente, a batalha do meu esforço evoluiu
na razão inversa do soldo que lhe era devido.

Os outros, os infelizes, barricando-se com lamúrias
e alimentando-se com doses suaves de indolência,
lá arriscam uns esquemazitos,
para, airosamente, se aliviarem do trabalho e da polivalência.

Mas, calmamente, burlam a luta da vida,
num esforço positivamente inverso ao resultado obtido...

Esses que declaram inânimes que nada sabem
e tudo desconhecem, acossam-se, todas as vezes na vida,
dos projectos audazes e desafios misteriosos,
(não vão eles finar-se com o esforço para tal exigido...)

Mas, infalivelmente, ganham as contas da vida,
saldando-se sempre com um valor acrescido.

Diga-me, Senhor Pablo Neruda,
de que me valeram, então, as doses maciças de esforço em estar viva
se, na verdade, é naquela morte lenta que os outros alcançam realmente a vida?

Desesperadamente...

C.

(Lisboa, 15 de Janeiro de 2009).

Sem comentários:

Enviar um comentário